segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Ricardo Reis

De formação clássica, "pagão por carácter", segue Caeiro no amor da vida rústica, junto da natureza. Mas, enquanto o Mestre, menos culto e complicado é (ou pretende ser) um homem franco, alegre, Reis é um ressentido que sofre e vive o drama da transitoriedade doendo-lhe o desprezo dos deuses. Afligem-no a imagem antecipada da Morte e a dureza do Fado. Daí, ele buscar o refúgio dum epicurismo temperado de algum estoicismo, tal como em Horácio, seu modelo literário: "Abdica e sê rei de ti próprio". Lúcido e cauteloso, constrói, para si urna felicidade - relativa, mista de resignação e moderado gozo dos prazeres que não comprometam a sua interior. Trata-se de fruir, muito consciente e ponderadamente, as coisas acessíveis sem demasiado esforço ou risco. Latinizante no vocabulário e na sintaxe, o seu estilo é densamente trabalhado e revela ainda, muito claramente, o seu tributo à tradição clássica no uso de estrofes regulares, quase sempre de decassílabos nas referências mitológicas, na frequência do hipérbato, na contenção e concisão altamente expressivas e 1úcidas.
(in Edições Sebenta)
A partir da carta a Adolfo Casais Monteiro
nasceu no Porto (1887);
foi educado num colégio de jesuítas ;
”É latinista por educação alheia e semi-helenista por educação própria”;
médico;
viveu no Brasil, expatriou-se voluntariamente por ser monárquico;
Interesse pela cultura Clássica, Romana (latina) e Grega (helénica);
Fisicamente:
”Um pouco mais baixo, mas forte, mais seco” do que Caeiro;
” de um vago moreno”; cara rapada;
Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa, é o poeta clássico, da serenidade epicurista, que aceita, com calma lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as coisas. “Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio”, “Prefiro rosas, meu amor, à pátria” ou “Segue o teu destino” são poemas que nos mostram que este discípulo de Caeiro aceita a antiga crença nos deuses, enquanto disciplinadora das nossas emoções e sentimentos, mas defende, sobretudo, a busca de uma felicidade relativa alcançada pela indiferença à perturbação.
A filosofia de Ricardo Reis é a de um epicurismo triste, pois defende o prazer do momento, o “carpe diem”, como caminho da felicidade, mas sem ceder aos impulsos dos instintos. Apesar deste prazer que procura e da felicidade que deseja alcançar, considera que nunca se consegue a verdadeira calma e tranquilidade – ataraxia.
Ricardo Reis propõe, pois, uma filosofia moral de acordo com os princípios do epicurismo e uma filosofia estóica:
- “Carpe diem” (aproveitai o dia), ou seja, aproveitai a vida em cada dia, como caminho da felicidade;
- Buscar a felicidade com tranquilidade (ataraxia);
- Não ceder aos impulsos dos instintos (estoicismo);
- Procurar a calma, ou pelo menos, a sua ilusão;
- Seguir o ideal ético da apatia que permite a ausência da paixão e a liberdade (sobre esta apenas pesa o Fado).
Ricardo Reis, que adquiriu a lição do paganismo espontâneo de Caeiro, cultiva um neoclassicismo neopagão (crê nos deuses e nas presenças quase divinas que habitam todas as coisas), recorrendo à mitologia greco-latina, e considera a brevidade, a fugacidade e a transitoriedade da vida, pois sabe que o tempo passa e tudo é efémero. Daí fazer a apologia da indiferença solene diante o poder dos teus e do destino inelutável. Considera que a verdadeira sabedoria de vida é viver de forma equilibrada e serena, “sem desassossegos grandes”.
A precisão verbal e o recurso à mitologia, associados aos princípios da moral e da estética epicuristas e estóicas ou à tranquila resignação ao destino, são marcas do classicismo erudito de Reis. Poeta clássico da serenidade, Ricardo Reis privilegia a ode, o epigrama e a elegia. A frase concisa e a sintaxe clássica latina, frequentemente com a inversão da ordem lógica (hipérbatos), favorecem o ritmo das suas ideias lúcidas e disciplinadas.
A filosofia de Reis rege-se pelo ideal “Carpe Diem” – a sabedoria consiste em saber-se aproveitar o presente, porque se sabe que a vida é breve. Há que nos contentarmos com o que o destino nos trouxe. Há que viver com moderação, sem nos apegarmos às coisas, e por isso as paixões devem ser comedidas, para que a hora da morte não seja demasiado dolorosa.
-   A concepção dos deuses como um ideal humano
-   As referências aos deuses da Antiguidade (neo-paganismo) greco-latina são uma forma de referir a primazia do corpo, das formas, da natureza, dos aspectos exteriores, da realidade, sem cuidar da subjectividade ou da interioridade - ensinamentos de Caeiro, o mestre de todos os heterónimos
-   A recusa de envolvimento nas coisas do mundo e dos homens

Ricardo Reis

Ricardo Reis nasceu em Lisboa, às 11 horas da noite do dia 28 de Janeiro de 1914. Foi discípulo de Alberto Caeiro, de quem adquiriu a lição de paganismo espontâneo. Há informação dando conta de que teria embarcado para o Brasil em 12 de Outubro de 1919. Em Ricardo Reis,

"Há a renúncia de quem atingiu
os píncaros da humana lucidez
e abstrai seus conceitos de impertinência e símbolos
da contemplação voluntária de uma natureza
quem o homem iguala
à essencialidade ideal que lhe basta"

Esse heterónimo pessoano, numa arte poética particularmente sua, procurou sempre o mais alto, o impossível até, para encrostar uma poesia refinada, concisa, elíptica, cunhada em linguagem esmerada e com vocabulário algo alatinado. São ontológicas, suas modernizadas odes horacianas: "Lídia", "Coroai-me de Rosas", "O mar Jaz" e "Sábio é o que se Contenta", todas de 1914. De 1916 são mercantes: "Não a Ti, Cristo" e "Não a Ti, Cristo, Odeio...". Nestas odes, prevalece o apolíneo comprovado por uma moderna consciência do fazer artístico. Muitas delas apareceram primeiramente publicadas na revista Athena e, principalmente, na Presença, sempre indiferentes ao social, mas acentuadamente consciente da efemeridade da vida.

Reis leva o paganismo de Caeiro à sua expressão mais ortodoxa, através de um neoclassicismo neo-pagão consciente, cultivando a mitologia greco-latina. Clássico por excelência, idealista e platônico no amor, constata o efêmero da vida e anseia, no íntimo, por uma fenomenológica eternidade terrena.

Segundo Linhares Filho, sob a perspectiva do ser, pode-se dizer que Ricardo Reis ama o impossível, mas sob a perspectiva do "Parecer", ele

"ama o infinito porque mais do que todos
se apega à vida, desejando-a infinda,
sob a simulação de resignar-se com a transitoriedade."

Como se observa, amando o impossível ou o infinito, Ricardo Reis sempre procurou os píncaros, como a fugir (fingindo) de uma realidade terrena que verdadeiramente queria viver, eternamente.